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24 de Abril de 2024

A partidarização da imprensa, os Civita e a Editora Abril

As redações das grandes empresas jornalísticas se encheram, sob a inspiração de Roberto Civita, de réplicas de Mainardi e Azevedo. Faz anos que foi abandonado o cuidado com coisas como provas para alicerçar notícias.

Publicado por Carla
há 8 anos

Por Paulo Nogueira

O barão de imprensa que liderou o processo de partidarização da imprensa foi Roberto Civita, da Editora Abril.

Pouco depois da posse de Lula, em 2003, a Veja de RC abandonou o jornalismo para se transformar num instrumento de propaganda do antipetismo fanático.

Segundo o jornalista Ricardo Kotscho, que participou da primeira equipe de Lula, o motivo da atitude de RC foi o dinheiro.

Não era um fato novo. As empresas de jornalismo do Brasil não vivem e nem sobrevivem dos recursos públicos. Dependem visceralmente deles desde sempre.

Kotscho conta que foi pedir dinheiro a Lula no começo do governo deste. Mais dinheiro ainda do que aquilo que já vinha sendo transferido para a Abril por meio de anúncios e de financiamentos do BNDES.

Não foi atendido.

Começou aí, diz Kotscho, a guerra da Abril contra Lula e o PT. Pode ter havido outra motivação além das moedas. Mas, a despeito de quais tenham sido as razões de RC, em pouco tempo na presidência Lula já tinha a Veja perseguindo-o selvagemente.

Alguns movimentos na redação foram marcantes na transformação da Veja. O diretor de redação, Eurípides Alcântara, tinha o perfil ideal para se prestar ao papel deprimente de executor da estratégia que mataria o jornalismo da revista e a tornaria a publicação mais odiada e mais odiosa da história da mídia nacional.

Mediano, sem nada de inovador, Eurípides – recém afastado – é aquele tipo que nasceu para obedecer e não para mandar. Era exatamente isto que Roberto Civita queria para a Veja. O que ele menos desejasse era alguém que o desafiasse.

Dois colunistas desempenharam também um papel relevante no novo perfil da Veja: Diogo Mainardi, na edição impressa, e Reinaldo Azevedo, no site.

Mainardi e Azevedo inauguraram a era do jornalismo patronal e plutocrático na Veja. O maior talento de ambos era e é atacar sistematicamente Lula e o PT.

Pode-se dizer tranquilamente que, sem Lula, os dois continuariam a ser o que sempre foram: jornalistas de segunda linha, inexpressivos, arrastando carreiras opacas.

Mainardi e Azevedo receberam holofotes em dose colossais da Veja por fazerem exatamente o que Roberto Civita queria que fizessem. Naquela época, eram poucos os jornalistas que se prestavam a uma tarefa tão infame.

Vistas as coisas em retrospectiva, as redações das grandes empresas jornalísticas se encheram, sob a inspiração de Roberto Civita, de réplicas de Mainardi e Azevedo.

Nos últimos anos, o principal atributo que os barões da mídia exigem de seus editores e principais repórteres é a disposição em investir contra Lula e o PT o tempo todo.

Já faz anos que foi abandonado o cuidado com coisas como provas para alicerçar notícias. Também nisso a Veja liderou a gangue. É clássica uma capa em que a revista publicou um dossiê sobre alegadas contas de petistas como Lula no exterior sem conseguir, como o texto admitia, “confirmar e nem desmentir” as denúncias.

Uma questão de vaidade pode ter sido importante também para a decisão de Roberto Civita de fazer da Veja um panfleto.

Ele ficou deslumbrado com o título de derrubador de presidentes no caso do impeachment de Collor. A Veja teve uma atuação de destaque na remoção de Collor, no começo dos anos 1990.

Foi o apogeu do prestígio da Veja.

Nos anos seguintes, a revista começou um longo processo de declínio. A chegada da internet anunciou o fim da era das revistas impressas.

Derrubar mais um presidente – agora Lula – poderia devolver a relevância perdida à Veja. Quanto isso pesou na mente de Roberto Civita? Para muitos que o conheceram na intimidade – eu entre eles –, muito.

Não se tratava apenas de reerguer a Veja, mas a ele próprio. RC tinha um déficit crônico de autoestima, como é tão comum em herdeiros. Quem construiu a Abril foi seu pai, Victor Civita, o VC.

Do ponto de vista jornalístico, RC era um editor de fachada. Não sabia escrever, não sabia fazer um título de capa, não conseguia sequer explicar com clareza o que queria, tal o apego a detalhes e tamanha a confusão com que se expressava.

Não fosse filho do dono, dificilmente teria sido admitido como estagiário na redação da Veja.

Sua insegurança patológica era compensada por coisas como uma sala monumental, de dois andares, e uma guarda pessoal de vários seguranças que o acompanhavam a toda parte.

Quando ele foi me visitar em 2000 no hospital depois de uma cirurgia, os seguranças bloquearam o andar inteiro em que eu estava para que RC fosse me desejar boa recuperação.

O caos psicológico de Roberto Civita ajuda a entender a metamorfose da Veja. Quando ele morreu, há três anos, a revista já era uma caricatura criminosa do que fora.

Roberto Civita jamais foi admirado pelos editores mais graduados da Abril, que conheciam de perto seus limites baixos.

Mas por seus pares, os demais barões da imprensa, acabou se tornando uma referência, pela qualidade jornalística da Veja no período compreendido entre sua fundação, em 1968, e o início da década de 1990.

Graças ao talento extraordinário de jornalistas como Mino Carta, José Roberto Guzzo e Elio Gaspari, a Veja se consagrou então como a melhor escola de jornalismo do Brasil.

Para os demais barões, o crédito foi não para quem de direito, os diretores de redação brilhantes da revista, mas para o dono. Eles não imaginavam o quanto da grandeza da Veja se devia à forma como Mino, Guzzo e Elio se insurgiam contra determinações de Roberto Civita.

Foi nessas circunstâncias que os Marinhos e os Frias acabaram por repetir as passadas de RC. Editores e colunistas ao estilo de Mainardi e Azevedo se multiplicaram pela imprensa brasileira.

Hoje, no caso mais espetacular de partidarismo, o Jornal Nacional é como uma versão eletrônica da Veja. Neste processo, o pudor foi perdido entre os jornalistas patronais. Ninguém mais se esforça por mostrar parcialidade.

Um caso simbólico é o do diretor da Globo Erick Bretas, que fez campanha abertamente pelo impeachment em seu Facebook e, em determinado momento, se fantasiou ali de Sérgio Moro.

A mídia brasileira virou uma imensa Veja.

O objetivo de Roberto Civita de derrubar o governo petista está na iminência de ser alcançado. Mas a um custo terrível. O estoque de credibilidade da mídia foi consumido inteiramente.

Credibilidade, como virgindade, é coisa que não se recupera. O público de esquerda e centro esquerda foi o primeiro a largar os veículos da grande mídia, a começar pela Veja. O mesmo caminho de debandada seria seguido pelo público de centro.

Sobrou a faixa personificada pelo advogado que recentemente se achou no direito de insultar Zé de Abreu num restaurante apenas por ele ser petista. É a direita tosca, ignorante, preconceituosa – os perfeitos idiotas brasileiros.

Não há jornal, revista, site ou o que for que consiga ser respeitado com este tipo de audiência desqualificada.

Isso quer dizer que Roberto Civita e seguidores ganharam no curto prazo, mas perderam irremediavelmente no longo.

É uma vitória que haverá de ser lamentada no futuro.

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Minha esposa era professora, minhas irmãs são professores e algumas escolas fizeram convênio para receber gratuitamente esta revista como forma de aumentar suas vendas.Em 1996 era assinante desta revista e ganhei 01 ano gratuitamente. Com advento da internet, reconheci esta revista fascista que com seus jornalistas vendidos sempre apoiaram á direita.Temos que ficar atentos não só com esta editora, mas com outras fontes de informação que transmite informações veladas e sem critério ético. continuar lendo

Jose Francisco Moreira Neto,
Quando a gente começa a ter acesso a diferentes fontes de informaçao a gente compreende o quanto estivemos sendo manipulados por vejas, globos, folhas e outros veiculos que, como voceh bem escreveu, nao tem nenhuma ética. continuar lendo

Que diferença faz ser de direita ou de esquerda ... uns serão os facistas dos outros.

A imprensa esquerdista também não merece um mínimo de credibilidade partindo do mesmo raciocínio do autor.

Não há imprensa imparcial, cite-se as comandadas pelo Estado (que deveria representar a neutralidade), que nada mais são do que um meios de propaganda pessoal e partidária de quem está no poder.

Basta ver a recente e ridícula tentativa da Dilma em destinar R$ 100 milhões para usar em benefício de sua manutenção no poder .... e se não houvesse o outro lado, quantos saberiam da manobra?

Cabe a cada um manter seus critérios de discernimento, o que é difícil por não se investir em educação de base ... o que geraria melhores eleitores e não a massa que segue o cabo eleitoral.

Como se sabe muitos professores aliciam alunos desde cedo, o que vem causando o surgimento de leis sobre neutralidade no ensino, pois o aliciamento é uma violação grave ao direito ao desenvolvimento dos menores.

Mas antes de tudo a melhor arma contra as ditaduras é a comunicação, sem uma imprensa livre não há democracia, não se pode viver só de direita e nem de esquerda.

Sabe-se que se a Veja virou um instrumento de direita, por outro lado é um dos principais alvos de críticas dos esquerdistas, ainda que infundadas pois atentam aos seus interesses. Fatos são fatos e não se confundem com opiniões pessoais, portanto é preciso ver o que está sendo exposto.

Veja e globo podem manipular tanto quanto um político no palanque cercado de artistas fazendo meios discursos sobre meias verdades, ou seja, só o que lhe interessa expor.

Não se pode confundir a veracidade de conteúdo com a predisposição por esta ou aquela corrente. Mas cabe aos meios de comunicação, sempre, suscitar algo mesmo que a princípio não se possa provar, pois em política transparência é o princípio mais violado em complemento a imoralidade e ilegalidade. continuar lendo

Para início de conversa, nenhum meio é neutro, nem poderia ser.

Desta feita, o autor, que tem um posicionamento óbvio e evidente, omite-se em sua opinião quanto aos seus pares ideológicos, enquanto tenta fantasiar uma perseguição malévola - do mesmo meio midiático que empregou Mino Carta.

Que, aliás, foi o responsável por dar a atual feição da Veja, com uma postura opinativa, panfletária e agressiva. E que replicou exatamente esse padrão, quando criou a Carta Capital.

Há, claro, de se mencionar (e condenar) o patrocínio governamental a certos meios midiáticos. Não é exercício legítimo da liberdade de imprensa, mas vergonhosa subserviência, comprada com nosso dinheiro.

Evidentemente, o autor tem todo o direito de ser um hipócrita. E qualquer meio midiático tem o direito de defender as opiniões de seus proprietários, desde que o cidadão não seja obrigado a pagar para ouví-las.

Assim funciona a liberdade de imprensa. E é para que Mainardis, Azevedos, Cartas e Amorins da vida possam vociferar suas opiniões aos quatro cantos do mundo.

Vivam com isso. continuar lendo